#20 - talvez eu esteja atrasado
sobre a minha necesssidade de ser levado a sério e conciliar o meu "eu escritor" com meu "eu adolescente"
Nem era pra eu estar escrevendo sobre isso. O tema que eu tinha pensado era outro, já tava até anotado na aba “próximas edições da por entre palavras” lá no Notion, mas ontem à noite, as coisas mudaram.
Eu estava navegando pelo Substack e vi um texto que chamou minha atenção; me identifiquei com algumas partes dele. E aí, surgiu a ideia pra essa edição - o que considero um grande progresso, já que não sou de me expor e dessa vez o texto vai ficar bem pessoal.
Mas vamo lá.
Talvez eu esteja atrasado
Eu sempre quis ser levado a sério. Sempre mesmo. Acho que isso é consideravelmente normal; querer que as pessoas realmente se interessem pelo que você fala ou faz e se importar demais pela forma como você é visto. Isso acontece com todo mundo, acho; nem que seja por um curto e ínfimo momento. Não dá pra evitar.
Desde criança eu penso assim; nessa coisa de ser levado a sério e o medo dos outros me acharem *insira adjetivos negativos aqui*. Hoje em dia não me importo mais com o que os outros pensam sobre mim ou sobre o que eu faço; liguei o foda-se completo, mas esse papo de ser levado a sério ainda me pega.
Porque, mesmo que eu não queira agradar todo mundo e nem me importe com o que as pessoas pensam ou falam sobre qualquer coisa minha que elas não tem nada a ver - isso nem é da minha conta, aliás - quero ser reconhecido pelo meu trabalho. Quero que as pessoas leiam e se interessem pelo que escrevo e só a possibilidade de isso nunca acontecer já me paralisa.
Tà, agora eu forcei um pouco. Sei que ainda vão surgir muitas oportunidades pelo caminho quando se trata da escrita e de trabalhar com livros de modo geral; afinal, eu comecei a escrever de fato à pouco mais de dois anos. Tem muito tempo pela frente.
Dentre todas as áreas da minha vida, a escrita é a coisa que eu mais levo a sério e mais me dedico. Com toda a certeza. Porque não é um hobby; não é algo que eu faço só por fazer e sem me cobrar por isso; muito pelo contrário. Eu me cobro muito; muito mesmo. É o meu trabalho.
Escrever e editar e ajustar o livro até ter a melhor versão possível e divulgá-lo e depois publicar a história. Eu preciso fazer isso para que o mercado literário; outros autores, editoras, agências e criadores de conteúdo saíbam quem eu sou, conheçam meus livros e meu trabalho. Mesmo que eu não tenha a quantidade suficiente de seguidores ou de leitores para ser conhecido por uma parcela considerável de pessoas; ou que a renda gerada pelos livros não seja muita…é o meu trabalho.
E eu não vou chegar aqui e romantizar tudo isso dizendo que sempre é bom ser escritor; de que é tudo incrível a todo o tempo e que não existem partes ruins - aliás, criei essa newsletter para fazer justamente o contrário - porque tem muita coisa que eu não gosto de fazer quando se trata da escrita; porque é um trabalho como qualquer outro.
E o ponto é que eu tô sempre fritando o meu cérebro pra pensar em formas de conhecer pessoas na minha área e demonstrar ser responsável e um bom escritor para que autores e editoras percebam a minha presença; mas mesmo assim, mesmo que isso dê certo em vários momentos, mesmo que eu já tenha conhecido alguns autores e outras pessoas que estão dentro do mercado literário; algo ainda permanece na minha cabeça.
Talvez seja só a voz da autossabotagem e toda a ansiedade que eu sinto sempre - mesmo que eu não goste de mostrar isso - mas, toda vez que penso no meu trabalho como um todo; tenho a sensação de estar ficando pra trás.
Ok, vou explicar.
A maioria dos escritores que acompanho já fizeram um certo progresso na carreira. Seja trabalhando com editoras tradicionais ou agências ou tendo inúmeras páginas lidas na Amazon ou trabalhando com a escrita em tempo integral. E aí vem a comparação; porque parece eu não estou fazendo certo, que a minha escrita é ruim, que eu tô atrasado.
Acho que isso já é autoexplicativo; afinal, comecei a trabalhar com a escrita bem depois que boa parte dos autores que acompanho e, pra mim - e pra maioria deles, também - não existe a possibilidade de escrever em tempo integral. Mas mesmo assim, não consigo não sentir que estou atrás de todo mundo.
Tem muitos eventos literários que não consigo ir, e não faço parte de um grupo de amigos escritores. Sei que todo mundo tem seus problemas e às vezes nem tudo o que mostram é 100% verdade, mas muita coisa passa pela minha cabeça.
Eu sou novo demais. Os meus livros são ruins. Não estou me esforçando o suficiente. Preciso ser reconhecido. Esse ano as coisas têm que andar; porque parece que eu continuo parado no mesmo lugar.
É mais uma vez a autossabotagem e a ansiedade preenchendo tudo, mas…não é só isso.
Como equilibrar os dois lados?
Nunca falo sobre isso por aqui - e em nenhum outro lugar, na verdade. Acho que foi medo do que poderia acontecer se eu falasse, mas acho que aqui no substack é mais seguro do que o instagram.
De todas as pessoas que trabalham com livros - pelo menos as que vejo por aí - nenhuma delas tem a minha idade. E isso é óbvio; acho que é bem difícil um adolescente escrever como um trabalho. Não que a minha idade importe tanto assim, mas eu nunca falo disso. Nunca dou alguma brecha pra, sei lá, alguém do mercado literário descobrir que faço quinze anos em março.
Porque, bom; mesmo que talvez seja só coisa da minha cabeça, ninguém vai me levar a sério se isso acontecer. Ninguém vai ler o que escrevo porque a primeira coisa que vão pensar é: “isso não vai estar bom, ele é novo demais” ; ou não vão me tratar de igual pra igual em eventos literários ou em conversas de modo geral. Acho que a pior coisa que poderia acontecer seria tratarem isso como uma grande questão; por isso, nunca comento nada.
E, sim, nesse exato momento eu tô imaginando você; leitor, pensando exatamente nessas palavras. Talvez eu devesse ter escrito a minha primeira ideia pra essa edição, afinal de contas. Por outro lado, a possibilidade de ninguém se importar é grande também - pelo menos aqui no substack. Essa ideia de ser um escritor bom ou ruim dependendo da idade que você tem é meio absurda, mesmo que às vezes ela passe pela minha cabeça. Então, talvez; só talvez, ninguém se importe. - isso é um alívio.
Mas tem o outro lado da moeda. As pessoas da minha idade com quem interajo todos os dias e que fazem parte do meu círculo social. Considerando que, hoje em dia, boa parte dos meus amigos têm interesses parecidos com os meus e uma afinidade; ao contrário de algum tempo atrás - falei disso na edição #17 - é bem difícil algum deles chegar pra mim e falar algo negativo sobre o meu trabalho ou meus interesses. Não que alguém já tenha feito isso e, mesmo se fizesse, eu não me importaria muito; mas algumas pessoas da minha idade ficam confusas quando eu pronuncio aquelas três palavras: “eu sou escritor”.
De verdade, eu entendo. É incomum. A reação dos outros nem é um problema real pra mim, mas às vezes, parece que eu não me encaixo em certas coisas. Não necessariamente apenas por trabalhar com a escrita; tem outras coisas que contribuem para essa ideia de: “você é diferente dos outros adolescentes” - alguns dos meus interesses; a escrita sendo um deles, a minha forma de agir e/ou de falar às vezes ou qualquer outra coisa que seja fora do esperado - esse texto da clara explica bem o que tô querendo dizer; foi daí que eu tirei a ideia dessa edição.
Não quero que isso soe como: “Nossa, eu sou diferentão e ninguém me entende”; porque sinceramente, tem muita gente parecida comigo - como disse antes, a maioria dos meus amigos - e pessoas legais com quem consigo ter uma relação mais leve, então não; não sou tão diferente assim e nem gosto muito desse papo.
A parte difícil mesmo são os meus pensamentos - porque parece que tem 83 abas abertas na minha cabeça ao mesmo tempo.
Nem sempre eu consgo conciliar o meu “eu escritor” e o meu “eu adolescente”; se é que isso faz algum sentido.
Desde que comecei a ver a escrita como um trabalho, sempre separo esses “dois lados”; eles não podem andar juntos. O maior motivo disso é aquilo que eu disse antes sobre ser levado a sério; então sempre mantenho as duas coisas separadas.
De um lado, eu tô escrevendo e criando conteúdo e falando com prestadores de serviço para melhorar a minha história e pensando em um futuro na escrita à longo prazo; e do outro, estou conversando com meus amigos sobre uma série ou estudando pra alguma prova.
Não sei se é só coisa da minha cabeça, mas parece bem difícil “equilibrar” essas duas partes para que nada se sobressaia; afinal, não dá pra passar o tempo todo trabalhando e não interagir com pessoas da minha idade, mas não publicar os livros não é uma possibilidade.
Em certos momentos, admito, eu não me permito ser adolescente. Como disse no início desse texto, a área da minha vida que mais levo a sério é a escrita; então o outro lado fica em segundo plano em mais momentos do que eu gostaria de admitir.
Quando penso na sensação de estar atrasado e ficando para trás das outras pessoas da minha área, acabo me comparando. Afinal, todo mundo - ok, nem todo mundo; mas a maioria dos autores que acompanho - tem um reconhecimento considerável no mercado independente, muitas vezes trabalham com editoras tradicionais e/ou já fizeram um progresso considerável em outras áreas da própria vida além do trabalho - coisa que eu (ainda) não fiz.
O problema é que eu nunca paro pra pensar que ainda tenho muito tempo pra fazer isso acontecer. Ás vezes esqueço que sou adolescente e que é normal fazer merda ou errar de vez em quando ou não conseguir todas as oportunidades ao mesmo tempo. Afinal, tô me comparando com pessoas mais velhas que eu; que passam por coisas diferentes das minhas. E todo mundo tem problemas; mesmo que não os mostre quase nunca (me incluo nisso).
Talvez o fato de eu ser adolescente não importe tanto para o meu trabalho como eu penso; talvez o meu “eu escritor” e o meu “eu adolescente” nem sejam - ou nem precisem ser - dois lados totalmente separados, mas sim; uma coisa só.
CONSIDERAÇÕES:
Acho que essa foi a edição mais pessoal que já escrevi, mas tô aliviado por finalmente ter colocado isso pra fora :)
Agora, algumas indicações:
lendo: semana passada eu terminei de ler Água Doce , de Akwaeke Emezi. Esse livro foi diferente de tudo que eu já li; a narração, o enredo, os personagens…tudo mesmo. Se você está procurando livros que abordem vivências trans por um ponto de vista menos ocidental, recomendo o leitura.
ouvindo: esse mês comecei a ouvir mais música brasileira; na maioria gêneros como R&B, pop, MPB (não sei se é um gênero, falem nos comentários). criei uma playlist de brasilidades ; se você também curte, aproveita ;)
newsletter (sim, vou indicar pelo menos uma news por semena):
Eu gostei muito desse texto e da newsletter como um todo, vale a pena dar uma olhada ;)